4/21/2016

O caso Ematum. O que se passa em Moçambique?

MOÇAMBIQUE | Moçambique admitiu esta semana que escondeu do Fundo Monetário Internacional (FMI) um montante superior a mil milhões de dólares de dívida externa. A instituição viu nesta atitude do governo moçambicano um “primeiro passo importante”, mas o reconhecimento de culpa não foi suficiente para demover o FMI de cancelar o pagamento da segunda tranche de um empréstimo de 285 milhões acordado no ano passado.


O que se passa em Moçambique?

O “Caso Ematum” estalou quando a Economist Intelligence Unit (EIU), a unidade de análise da revista britância The Economist, revelou que os números oficiais do Ministério das Finanças moçambicano sobre o montante de dívida pública não refletem os empréstimos da Empresa Moçambicana de Atum (Ematum) e da Proindicus, duas empresas públicas.
Dívida pública oficial não contabiliza obrigações da Ematum nem o empréstimo da Proindicus
Segundo os dados oficiais, a dívida pública moçambicana aumentou 31% em relação ao ano anterior. Contudo, referem os analistas da EIU, este aumento não inclui dois aspetos essenciais: as obrigações de dívida emitidas pela Ematum em 2013, no valor de 850 milhões de dólares, e o empréstimo de 622 milhões de dólares contraído pela Proindicus, também em 2013 e até agora nunca divulgado pelo governo moçambicano.

Ora, esta emissão de 850 milhões de dólares serviria, oficialmente, para arrancar com a Ematum, mas terá sido canalizada, essencialmente, para gastos com defesa. Segundo o portal moçambicano Verdade, os barcos de pesca comprados pela Ematur custaram 350 milhões de dólares, não se sabendo em que foram utilizados os restantes 500 milhões.
Entretanto, este mês, estas obrigações foram renegociadas pelo Estado moçambicano para transformar o remanescente da dívida em títulos de dívida soberana de Moçambique.
Perante estes factos, os analistas da EIU questionaram a “transparência orçamental de Moçambique”, levantando dúvidas sobre o montante de dívida pública do país.

Poucos dias depois, nova polémica: de acordo com o Financial Times, além das obrigações da Ematum e do empréstimo à Proindicus, houve ainda um terceiro empréstimo a uma empresa pública, não nomeada, num valor superior a 500 milhões de dólares.
O valor da dívida pública não declarada de Moçambique ascende a mais de 1,8 mil milhões de dólares.

O balanço: com os cerca de 700 milhões de dólares em dívida soberana que substituíram as obrigações da Ematum, o empréstimo de 622 milhões à Proindicus e estes 500 milhões a outra empresa pública, o valor da dívida pública (não declarada) ascende a mais de 1,8 mil milhões de dólares.

E o resultado: o FMI cancelou uma visita a Moçambique programada para esta semana, bem como o pagamento de 155 milhões de dólares, que seriam a segunda tranche de um empréstimo de 285 milhões acordado no ano passado, e os juros da dívida soberana de Moçambique dispararam para o máximo histórico de 14%.

O que são a Ematur e a Proindicus?

No centro da polémica está, em primeiro lugar, a empresa pública Ematum. A empresa de pesca de atum foi fundada em 2013, com capitais públicos e privados, contando com um capital social de 15 milhões de meticais (à volta de 251 mil euros). O Instituto de Gestão das Participações do Estado moçambicano detém 34% da empresa; a Empresa Moçambicana de Pesca detém 33%; e a Gestão de Investimentos, Participações e Serviços detém outros 33%.

No final de 2014, o último para o qual há dados disponíveis, a empresa reportou lucros de 850,54 milhões de meticais (14,2 milhões de euros). Porém, nesse período, o passivo da Ematum, entre empréstimos contraídos e pagamento de impostos diferidos, ascendia a 36,5 mil milhões de meticais (611,6 milhões de euros).

  Já a Proindicus, constituída em 2012, tem por objeto a “conceção, financiamento, implementação e gestão de sistemas integrados de segurança aérea, espacial, marítima, lacustre, fluvial e terrestre”, entre outras áreas relacionadas com segurança.
Os acionistas da Proindicus são anónimos. Segundo o Verdade, 50% do capital desta empresa é detido por uma outra sociedade anónima, a Monte Binga, um holding controlada a 100% pelo Estado moçambicano. O Estado é acionista da Monte Binga através do IGEPE.

Um mercado que “continua a fazer todo o sentido” para Portugal

“É provavelmente um dos piores casos de entrega de dados errados por parte de um governo que o FMI viu num país africano nos últimos tempos”. É assim que uma fonte do FMI descreve ao Financial Times a omissão do governo moçambicano. Para a mesma fonte, Moçambique está mesmo “à beira de uma crise financeira se as autoridades não tomarem medidas para lidarem com os riscos atuais”.

Para as empresas portuguesas, esta situação não representa, contudo, e pelo menos para já, motivo para preocupação.
A Portucel é uma das empresas que mais investe em Moçambique. O investimento total da empresa de produção de pasta de papel deverá ascender a 3 mil milhões de euros (2,7 mil milhões de euros), sendo que é um projeto de muito longo prazo, com duas concessões, ambas de 50 anos. Precisamente por ser um projeto de muito longo prazo, “não está dependente das questões atuais”, refere ao Dinheiro Vivo fonte ligada ao mercado.

Ao mesmo tempo, e ainda que, obviamente, seja preferível atuar num mercado cuja economia está a crescer, a verdade é que o abrandamento da economia moçambicana não tem, no curto prazo, um impacto negativo sobre a empresa; pelo contrário. “Quando a economia está pujante e há grandes empresas a contratar, os salários disparam”, aponta a mesma fonte.
E há ainda um terceiro aspeto: “No imediato, o projeto da Portucel até ganha interesse para o governo moçambicano, uma vez que outras empresas já estão a sair e a reequacionar investimentos, enquanto a Portucel está lá para ficar durante 100 anos”.

Neste contexto, fica claro que a situação de Moçambique “não altera em nada” a estratégia da Portucel e o país “continua a fazer todo o sentido” em termos de investimento.
O grupo Vila Galé não tem qualquer unidade em Moçambique mas, há dois anos, manifestou a intenção de investir no país. Na altura, Gonçalo Rebelo de Almeida, administrador do grupo hoteleiro, adiantou que a ideia seria inaugurar um unidade em Maputo. “Seria um hotel de cidade e há dois modelos em aberto: comprar ou arrendar um edifício que será construído”, disse então ao jornal Sol.

Desde então, não há grandes novidades sobre este mercado, mas Gonçalo Rebelo de Almeida admite ao Dinheiro Vivo que o interesse por Moçambique se mantém, independentemente dos acontecimentos das últimas semanas. “Existem conversações preliminares com um parceiro local que pretende fazer um investimento na construção de um hotel e depois fazer um contrato de gestão com a Vila Galé para essa unidade”, detalha.

Fonte: Msn Finança| Crítico melódico

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